Seria Robert Pattinson “A Última Verdadeira Estrela do Cinema”?
Ele pode ter desejado ser um ator, sem ser uma celebridade. Mas, então, ele transformou a sua fama em seu próprio tipo de performance.
Foi de Robert Pattinson a ideia de fazer uma aula de cerâmica. Desde que se tornou pai em março passado, o ator inglês de 38 anos tem procurado o que ele chama de “hobbies saudáveis”. Ele já considerou bonsai (“eles começam a apodrecer”), trapézio (“não dá para fazer isso em público”), tênis (“não tenho noção de espaço suficiente”), e dança (“minha medula espinhal congela”). Duas décadas em sua carreira de filmes, ele parece agitado por novas formas de expressar a si mesmo que não demandem uma equipe de centenas de pessoas, ou qualquer bagagem que venha com o fato de ser um dos homens mais famosos do mundo. Em anos recentes, ele inventou um prato bastardo parecido com arancini, chamado piccolini cuscino, ou “travesseirozinho” (“eu aprofundei muito nisso com um fabricante de alimentos congelados”); um sofá de quase 3m com braços de descanso quase tão largos quanto o assento (“Aquilo pesa uma tonelada – provavelmente uma das razões de ser tão difícil de vender”); e calças com bolsos verticais (“Porque eles sempre que ficar pra fora, como pequenas orelhas estranhas?”). Ele também está projetando uma cadeira de encosto reto com uma fenda atravessando o centro da poltrona e que “se abre como se você estivesse em um tipo de casulo”, ele diz. Para ilustrar a ideia, ele construiu uma maquete com um sex toy (brinquedo sexual) da FleshLight e um rolo de papel higiênico vazio.
Em uma tarde cinza de agosto, eu encontrei com o ator na casa de um de seus amigos na De Beauvoir Town, uma vizinhança frondosa à nordeste de Londres onde ele e sua noiva, a atriz e musicista inglesa Suki Waterhouse, estão em estadia com sua filhinha enquanto estão visitando de Los Angeles, e caminhamos até um estúdio de cerâmica a cerca de 1,6km rua abaixo. Em uma semana, Waterhouse, 32, vai abrir um show para Taylor Swift no Wembley Stadium, cantando músicas do seu recentemente lançado segundo álbum, “Memoir of a Sparklemuffin”. Até lá, Pattinson estará no Canadá gravando um filme com Jennifer Lawrence, mas primeiro ele gostaria de regravar uma narração para o seu próximo filme Mickey17, uma sátira distópica dirigida por Bong Joon Ho, o diretor sul-coreano e vencedor do Oscar por “Parasita” em 2019. Por agora, contudo, Pattinson está debruçado em uma mesa de trabalho esculpindo à mão uma caneca com uma alça distintamente fálica. “É uma cenoura gigante”, ele esclarece – um presente para os seus anfitriões. “Eles devem gostar muito de cenoura”, eu digo, mas a brincadeira não é percebida. “Eu só acho que seria muito satisfatório ter um copo tão largo assim”, ele diz. E quando eu começo a pensar que o ofendi, ele se inclina para trás para admirar o seu trabalho. “Isso tem um pouco de curvas”, ele diz com um sorrisinho. Fazer um pênis de cerâmica de forma intencional em frente a um jornalista não é apenas uma escolha, é um desafio. “Eu amaria ver como você usaria isto”, ele conta.
Apesar de aparecer em Harry Potter e o Cálice de Fogo (2005) aos 17 anos, e virar uma fixação da mídia alguns anos depois por interpretar um vampiro romântico em todos os cinco filmes da série Crepúsculo – no ápice do sucesso da franquia, ele alugava carros como isca e se escondia em porta-malas para evitar ser cercado por fãs e paparazzis – Pattinson é surpreendentemente desprotegido. Ele não leva o seu ofício ou a si mesma muito a sério: em um intervalo de 30min, ele me conta que é ignorante, frágil, aterrorizado, ego maníaco, terrível, cheio de ódio e vaidoso. O único recorte de revista pendurado na parede de seu quarto de infância em Londres, é uma cópia emoldurada de uma edição da People Magazine’s Sexiest Man Alive, de um ano que ele sequer foi incluído (George Clooney lhe deu como uma brincadeira). Recentemente, ele desenterrou seus prêmios de atuação e os colocou em uma estante; e depois de alguns dias, ele os devolveu para o depósito.
São tempos estranhos para ser um ator de Hollywood. No começo da carreira de Pattinson, a ascensão das mídias sociais destruiu a economia dos tabloide – o que, mesmo que fosse invasivo, mantinha as pessoas falando sobre ele. (“Foi uma época insana,” disse o seu amigo Zac Efron, 37, que em 2006 estrelou em High School Musical. “Eu estava preocupado em fazer com que ele estivesse bem, porque eu sabia o que aquilo estava fazendo comigo.”). Em 2020, o filme sobre viajem no tempo de Pattinson, Tenet, dirigido por Christopher Nolan, foi usado como um balão teste para determinar se o público retornaria aos cinemas depois que as restrições da pandemia começaram a amenizar. (Não voltaram). E embora seu filme de super-herói, The Batman, tenha estreado em 2022, o segundo na sequência da trilogia de Matt Reeves provavelmente não será lançado até o outono de 2026, parcialmente devido às graves do último ano. “Eu poderia verdadeiramente estar me aposentando até o fim deles,” diz Pattinson.
Para muitos dos seus colegas, as marcas registradas do que uma vez era considerada uma carreira de sucesso – a segurança de um papel em uma franquia com um grande diretor; o prestígio de algum trabalho em filmes indies aclamados; a liberdade de experimentar qualquer gênero; o poder de dizer não para a televisão – parecem agora impossíveis e antiquados. Não é o bastante para os grandes nomes de hoje apenas entregar uma performance convincente; é também esperado que eles aprendam coreografias do TikTok e comam asinhas de frango apimentadas no YouTube. E embora ainda existam homens em papéis principais que vêm de uma tradição artística – Timothée Chalamet, Adam Driver, Daniel Kaluuya – eles correm um risco, especialmente em uma época de apontar de dedos, quando figuras públicas estão com medo de serem muito autênticas, de acabarem parecendo semelhantes fracos dos homens difíceis que uma vez os inspiraram. Se Marlon Brando estivesse vivo atualmente, até mesmo ele teria que memorizar suas falas; haveria muitos namoradinhos da internet (Michael B. Jordan, Charles Melton, Paul Mescal) prontos para substituí-lo.
Para sua própria surpresa, Pattinson, que raramente faz aparições públicas e não tem perfil em redes sociais, emergiu como uma das últimas estrelas de cinema. “Nem em um milhão de anos eu pensei que ainda estaria fazendo isso quando consegui meu primeiro trabalho,” disse ele, “Eu não posso acreditar que eu ainda estou fazendo isso.” Por conseguir evitar os clichês da fama jovem, ele também manteve uma certa misticidade; ele não decaiu em vícios, tampouco teve que passar sua fase adulta tentando provar sua credibilidade. (Mesmo nesse ponto, ele ocupa um lugar não usual: ao contrário de atores metódicos como Christian Bale ou Jeremy Strong, que frequentemente aparentam bastante gravidade, ele não é um deprimido.) Talvez porque ele começou bem jovem, ou porque ele é lindo e esquisito, ele consegue ter as duas coisas: Como os galãs que emergiram durante o boom indie nos anos 90 – Johnny Depp, Leonardo DiCaprio, Brad Pitt, Keanu Reeves -, ele é um ator que, aconteceu, de se tornar um protagonista. Escrevendo para o The Times, a crítica de cinema Manohla Dargis descreveu Pattinson em 2019 como tendo uma “das fisionomias mais hipnotizantes – e agradavelmente enervantes – em filmes,” notando que em uma de suas performances, seus olhos “se arregalaram com protuberâncias e tremiam com emoções que pingavam sob uma máscara de vazio.” Ao invés de se apegar a um arquétipo – por um tempo, ele correu o risco de interpretar de forma perpétua o namorado pensativo -, ele aborda cada papel, sendo um pastor escorregadio no filme de Antonio Campos, O Diabo de Cada Dia (2020) ou um pássaro falante em The Boy and the Heron, de Hayao Miyazaki (2023), com uma convicção bizarra. “Se você aparece com uma ideia forte,” disse ele, “as pessoas não têm outra escolha além moldá-la.”
Parte do seu charme vem do fato de ser britânico; como Charlie Cox, Jamie Dornan, Andrew Garfield e Eddie Redmayne, todos os quais Pattinson fez amizade no começo de sua carreira, ele tem uma qualidade masculina que o torna mais envolvente que suas contrapartes americanas. (Ele não soa desonesto quando, por exemplo, reclama sobre ter má postura ou parece estar “se escondendo atrás de uma cortina” em muitas roupas masculinas.) Em seus primeiros filmes, ele se sentiu ansioso e deslocado. “Eu não conseguia definir o set de forma apropriada,” disse ele. “Eu não percebia que você deve desenhar uma linha entre o mundo do filme e o mundo da realidade.” Desde então, ele começa cada um dos seus filmes com uma caminhada pelo set de filmagens e tocando as paredes. “Eu sei quais são os parâmetros, e isso faz você se sentir mais seguro.”
Pattinson parece querer ser ator sem precisar lidar com o peso de ser uma celebridade — mas a fama, em si, funciona como uma espécie de performance, algo que ele aprendeu a encenar para sobreviver. Recentemente, ele reassistiu a uma entrevista que deu em 2011, onde contou uma história completamente inventada sobre ter visto um palhaço morrer na explosão de um carro quando era criança. “Minha voz não tinha nenhuma hesitação”, ele comenta, misturando orgulho e espanto. “Fiquei pensando: ‘O que foi isso? Você estava possuído?’”. Na verdade, ele só estava entediado. (Entre outras mentiras que já contou a jornalistas estão: que foi modelo de mãos femininas, que existe uma cena deletada de “Crepúsculo” envolvendo coprofilia e que afastou uma stalker levando-a para jantar e esgotando-a ao contar seus problemas). “Naquela época, a única coisa que as pessoas me perguntavam era sobre como era ser famoso. Você entra em um estado meio automático”, ele explica. Enquanto fala, Pattinson ajusta uma xícara que está modelando em argila, remove o excesso da alça que havia ficado exagerada e sorri. Mesmo nos momentos mais sinceros, ele está sempre, de alguma forma, interpretando.
No último Réveillon, Pattinson e sua namorada, Suki Waterhouse, viajaram para São Vicente e Granadinas, no Caribe. No controle de passaporte, o agente de imigração comentou: “Ei, você é o cara de ‘Crepúsculo’. Por que parou de atuar?”. Pattinson não sabia como responder. “Eu fiquei tipo… ‘Eu sou o Batman?’. “Ela só riu”, ele conta. Para ser justo, os fãs de seus primeiros trabalhos provavelmente não estavam interessados em assistir à biografia da cartógrafa Gertrude Bell, dirigida por Werner Herzog (“Rainha do Deserto”, de 2015), ou a um filme experimental de Brady Corbet baseado em um conto de Jean-Paul Sartre (“A Infância de um Líder”, do mesmo ano).
Em 2012, alguns meses antes da estreia de “A Saga Crepúsculo: Amanhecer — Parte 2”, último filme da série, Pattinson interpretou um gerente de fundos bilionário em uma adaptação do romance de 2003 de Don DeLillo, “Cosmópolis”, sua primeira de duas colaborações com o diretor David Cronenberg. Grande parte da trama, incluindo um exame de próstata com conotações eróticas, acontece no banco de trás de uma limusine. “Eu costumava pensar: ‘Preciso entender a lógica de onde esse personagem nasceu, sua classe social, o que os pais dele faziam’”, lembra Pattinson. “Com Cronenberg, percebi que pode ser mais sobre a musicalidade das palavras e qual a sensação ao dizê-las.” Em 2017, ele viveu um criminoso de baixo escalão no thriller policial “Bom Comportamento”, um estudo de desespero quase selvagem dos irmãos Safdie. E em 2019, cerca de uma hora após o início de “O Rei”, de David Michôd, baseado em peças históricas de Shakespeare, ele apareceu como um delfim sádico com um sotaque francês absurdo, fazendo gestos obscenos e entregando os diálogos mais ridículos e diabólicos do filme.
O cineasta americano Robert Eggers, que dirigiu Pattinson e Willem Dafoe em “O Farol” (2019), um filme de terror sobre dois faroleiros do século 19 que enlouquecem, diz que “Rob gosta de fazer escolhas inesperadas para surpreender seus colegas de cena e guarda isso para o momento em que as câmeras estão ligadas”. Durante as 35 filmagens em Nova Escócia, Pattinson, cujo personagem se masturba pensando em uma sereia e é devorado por gaivotas, raramente falava com alguém no set e passava a maior parte do tempo sozinho em uma tenda escura praticando expressões faciais grotescas. “O principal é lembrar constantemente qual é o seu trabalho”, diz ele. “É uma disciplina não gastar sua energia com nada além disso”.
No caminho de volta para a casa do amigo de Pattinson, algumas nuvens se formaram, e ele tirou os óculos escuros. Apesar de seus dois filmes mais recentes, “Tenet” e “The Batman”, terem arrecadado juntos 1 bilhão de dólares, e dele ser modelo da Dior Homme desde 2013, aparecendo em outdoors e pontos de ônibus, ele passou por uma fileira de pubs movimentados sem ser notado. Agora que está mais velho, a histeria diminuiu. “Há algo na natureza de ser novidade”, ele diz. “Eles pensavam: ‘Você nem é humano.’” Bruce Wayne, o industrial de Gotham City que vinga o assassinato dos pais combatendo o crime, é um dos personagens mais icônicos do cinema — Pattinson ainda tem a fantasia que usava quando criança —, mas na nova versão, pelo menos até agora, ele quase nunca aparece sem máscara. “Essa foi minha única ideia para o Bruce”, diz Pattinson. “Até agora, ele foi retratado como um playboy. Mas e se ele fosse completamente anti-social e meio agorafóbico?”
Há uma cena em “The Batman” em que Bruce diz a Alfred, seu mordomo e figura paterna, sobre o peso de ter um alter ego. “Se eu não puder mudar as coisas aqui, se eu não puder causar algum impacto,” ele diz, “não me importo com o que aconteça comigo.” A frase marcou Pattinson; ele também, claramente, se pergunta o que aconteceria se ele parasse de tentar corresponder às expectativas ou desconstruir a persona que criou para si mesmo. Desde cedo, ele percebeu que era apenas uma projeção das fantasias de outras pessoas. “Eu estava muito ciente,” ele diz, “de que ninguém realmente queria saber realmente nada sobre mim.” Quando pergunto a Pattinson como ele era quando criança, ele para de caminhar. “Eu… não sei,” ele responde. Em outro momento da nossa conversa, ele compara seu eu mais jovem a uma tigela perfeitamente aceitável, mas completamente esquecível, que ele teria esculpido: “Apenas… estava ali.”
Pattinson cresceu em Barnes, um belo subúrbio no sudoeste de Londres. Sua mãe, Clare, era caça-talentos de modelos. Seu pai, Richard, vendia carros vintage. Ele era um aluno mediano e péssimo em esportes, mas gostava de ouvir e tocar música. “Roubar coisas era minha principal preocupação”, ele diz, referindo-se, principalmente, a revistas pornográficas e barras de chocolate. (Mais uma vez, suas histórias podem ser difíceis de confirmar.) Aos 15 anos, Pattinson, que tem duas irmãs mais velhas, entrou em um grupo de teatro local. Pouco tempo depois, conseguiu ser aprovado para interpretar o filho de Reese Witherspoon em “Vanity Fair”, de Mira Nair, uma adaptação de 2004 do romance de William Makepeace Thackeray, ambientado na sociedade inglesa do século XIX. Só na estreia do filme ele descobriu que suas cenas haviam sido cortadas da edição final. No ano seguinte, o diretor de elenco desse filme, que ficou com pena dele, o indicou para o papel de um bruxo em “Harry Potter e o Cálice de Fogo”, de Mike Newell.
Naquela época, ele e seu amigo de infância Tom Sturridge, também ator, alugaram um apartamento na Old Compton Street, no coração de Soho. “Foi o apartamento mais nojento que já vi”, lembra Pattinson com carinho; ele tem quase certeza de que estavam bêbados quando assinaram o contrato. Todo mês de janeiro, Pattinson, que não tinha formação formal em atuação, viajava com Sturridge para Los Angeles durante a temporada de testes, mas nunca conseguiu nada. Em casa, passava a maior parte das noites tocando músicas no violão em eventos de microfone aberto pela cidade. Durante o dia, fazia audições para projetos como “Tróia” (2004) e “Velozes e Furiosos: Desafio em Tóquio” (2006). Ele chegou atrasado e com o lábio machucado — por beijar, não por brigar — para o teste do papel principal no filme de fantasia “Eragon” (2006). “Tem uma cena em que ele encontra um ovo de dragão e deveria ser um momento heróico,” conta o ator, que decidiu interpretá-lo como uma tragédia. “Lembro do meu agente dizendo que achavam que eu estava drogado.” Embora tenha deixado que acreditassem que ele era um traficante na escola — o boato, iniciado por ele mesmo, era de que escondia seu estoque em disquetes —, ele nunca foi tão descontrolado quanto alguns de seus colegas. “Haviam muitas festas diferentes em L.A.”, ele diz. “A ideia de ter que entrar em um carro e dirigir 15 minutos para ir a qualquer lugar me fazia ficar em casa. E aí você enlouquece completamente.”
Sobre “Mickey 17”, que estreia em abril, o personagem de Pattinson, é um membro da tripulação em uma missão de colonização espacial, que está prestes a congelar até a morte, tornando-se, em suas próprias palavras, “um picolé de carne”. A cena é interpretada para dar risadas; seu último suspiro soa mais como um choro. Mas Pattinson tem uma maneira própria de fazer o público considerar a humanidade em personagens negligenciados ou subestimados, seja interpretando um fotógrafo encarregado de tirar um retrato de James Dean (em “Life”, de 2015) ou o ajudante de um explorador britânico (em “Z: A Cidade Perdida”, de 2017). Mickey, um homem azarado que, acidentalmente, aceita ser descartável — alguém que realiza tarefas perigosas para o bem da expedição e é regenerado cada vez que morre —, nem sequer tem certeza se merece viver. Atormentado pela culpa e vergonha de uma vida desperdiçada, ele se martiriza para expiar sua própria mediocridade, mas também na esperança de acertar na próxima tentativa. Em seus momentos finais, um amigo pergunta: “Ei, Mickey, como é morrer?” O alívio no rosto de Pattinson oferece uma resposta difícil.
A primeira impressão do ator ao ler o roteiro de Bong, adaptado do romance de Edward Ashton de 2022, foi: “Ah, quero fazer algo no estilo do Jim Carrey.” Embora soubesse que interpretar uma vítima de crueldade constante no estilo de Lloyd Christmas, o motorista de limusine de dentes lascados de Carrey em “Debi & Loide” (1994), era, como ele coloca, “uma corda bamba incrivelmente difícil de andar”, o desafio o empolgou. Bong, de 55 anos, que desenha todos os seus próprios storyboards, conta que Pattinson estava ansioso para contribuir, oferecendo ajudar a revisar diálogos e “nos iluminando com humor e conhecimento de gírias que eu nunca teria descoberto por conta própria.” (Presume-se que a analogia de Mickey para levar um choque elétrico — “é como engolir uma enguia elétrica” — tenha sido sugestão do ator.) Em Bong, Pattinson encontrou um parceiro criativo. “Ele é um cara incomum,” diz Pattinson, observando que Bong filmava a última frase de uma cena primeiro e fazia mudanças no roteiro conforme necessário. “Todo mundo no set ficava tipo: ‘O que está acontecendo?’” Mais tarde, Pattinson me disse: “Os filmes que você mais gosta são os que parecem impossíveis no começo. É um salto de fé — apenas conseguir finalizar já é incrível.”
“Mickey 17” não é uma analogia sutil. Mark Ruffalo interpreta um comandante com uma obsessão por colonialismo que evoca medo e religião para incitar violência contra os habitantes de outro planeta. Há uma trama de assassinato frustrada; uma jovem mulher negra surge como sua rival política. Mas o filme, que foi filmado em 2022 e atrasado por causa da greve dos atores, também pode ser lido como uma metáfora para a natureza volátil da fama: Mickey não percebe no que se meteu até ser tarde demais — até que sua sobrevivência depende dos caprichos de outros. E enquanto ele suporta todos os tipos de abuso e exploração, ele percebe há um modelo mais novo dele mesmo, esperando para substituí-lo. “Há algo em Rob que naturalmente atrai sua simpatia,” diz Bong. “Parecia que ele também suportaria dificuldades e injustiças com um sorriso inocente.”
Uma semana após nossa aula de cerâmica, Pattinson me liga de um quarto de hotel em Calgary. Ele está lá para filmar “Die, My Love”, adaptação de Lynne Ramsay do romance de estreia de 2012 da escritora argentina Ariana Harwicz. Lawrence interpreta uma versão da narradora sem nome de Harwicz, uma jovem mãe com psicose pós-parto que, no livro, sonha em matar a si mesma e sua família; Pattinson, que interpreta o marido no filme, diz que a história é “hilária”. (Outros podem não compartilhar seu senso de humor: ele também considera “High Life”, de Claire Denis, um filme de 2018 que confunde a cabeça e aborda inseminação artificial entre prisioneiros espaciais — no qual o personagem de Pattinson é violentado por uma cientista interpretada por Juliette Binoche — uma comédia.) Ele parece empolgado com o projeto, embora um pouco solitário. A caminho de uma aula de dança matinal exigida para o papel, ele assistiu a uma transmissão ao vivo do show de Wembley de Waterhouse em seu celular.
Das quatro músicas que ela apresentou, pelo menos uma delas, “To Love,” é sobre ele. “Existe um universo onde nossos caminhos nunca se cruzaram?” ela canta. “Onde eu chamei sua atenção, mas então alguém chegou, e nós dois esquecemos?” O casal, que ficou noivo no ano passado, se conheceu em 2018 em uma festa em uma casa em Los Angeles. “Ela estava sentada em frente a mim,” diz Pattinson, que não se lembra de muito mais sobre o jogo de “Werewolf” que estavam jogando com Javier Bardem, Penélope Cruz, Al Pacino e outros atores. “Suki e eu continuamos fazendo um ao outro rir, a ponto de alguém nos dizer que não estávamos levando o jogo a sério. Foi um momento muito, muito doce.” Ele pronuncia essa última parte com um tom afetado, algo que faz quando se sente vulnerável.
Desde que começou uma família com Waterhouse, Pattinson parece ter se tornado um pouco mais sério. Embora ele já tenha sonhado em morar no sótão de uma catedral (“com uma cadeira,” ele diz), eles recentemente compraram uma casa em estilo colonial espanhol da década de 1920 ao norte de Hollywood e mantém um apartamento em Nova York. Ter uma filha, também, o mudou de maneiras inesperadas. Antes de seu nascimento, ele pensou em comprar uma arma para proteger a casa. “Mas então ela nasce,” ele diz, “e é apenas uma batatinha que faz cocô.” Dada a instabilidade da indústria cinematográfica, ele acrescenta que a permanência da paternidade o tornou mais centrado. Eggers notou uma diferença marcante em seu colaborador: quando se conheceram em 2016, Pattinson estava “curvado em sua cadeira com seu vape na mão, olhando por cima do ombro o tempo todo,” recorda o diretor. “Mas não vejo mais isso em sua personalidade.”
No trabalho, Pattinson parece estar se divertindo mais. Sua produtora, Icki Eneo Arlo — o nome é “apenas uma mistura de letras”, ele explica —, que ele fundou há dois anos com seu ex-assistente Brighton McCloskey, tem cerca de 20 filmes e séries em desenvolvimento, incluindo um documentário sobre a Seleção dos Estados Unidos de Futebol para Cegos; um filme dirigido por Lance Oppenheim chamado “Primetime”, inspirado no programa da NBC “Dateline: To Catch a Predator”; e uma comédia sobre um casal tentando salvar o casamento por meio do candaulismo. “Se você é apenas um ator, acaba não conhecendo ninguém além de diretores que querem que você interprete um príncipe inglês”, ele comenta. “Fazendo isso, conheci tantas pessoas diferentes e sinto que tenho algo a oferecer a elas. Isso também me tornou mais consciente do que estou fazendo como intérprete.”
Um dia, ele talvez queira dirigir. Por enquanto, produzir filmes já é suficiente como um plano de contingência, especialmente para alguém como Pattinson, que, segundo ele mesmo, sente que “tudo está desmoronando o tempo todo”. Parte disso, ele admite, é apenas imaginação. Mas há um outro aspecto da indústria cinematográfica — onde a estrela brilhante de hoje vira a notícia esquecida de ontem — que lhe parece muito real. Antes de encerrarmos, ele me diz que costuma lembrar de algo que Paul Newman, um dos grandes astros do cinema americano, disse certa vez sobre a vida útil de um ator: “No começo da sua carreira, é ‘Quem é Paul Newman?’ Depois, é ‘Quero Paul Newman.’ Em seguida, ‘Quero um jovem Paul Newman.’ E, por fim, ‘Quem é Paul Newman?’” Pattinson gosta da ideia de que todos começam suas histórias como completos desconhecidos. E, com uma mistura de resignação e alívio, ele acrescenta que, na maioria das vezes, é assim também que elas terminam.